Página:Lendas e Narrativas - Tomo I.djvu/120

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foi repetido em grìta confusa por milhares de bôcas.

De repente da banda da rua de Gileanes sentiu-se um tropear de cavalgaduras, que pareciam correr á redea solta: todos os olhos se volveram para aquella banda: muitos rostos empallideceram.

Uma voz de terror girou pelo meio das turbas.—­“São homens d’armas d’elrei!”—­Aquelle oceano de cabeças humanas redemoinhou a estas palavras, e começou a dividir-se como o mar vermelho diante de Moysés. N’um momento viu-se uma larga faixa esbranquiçada cortar aquella superficie movel e escura: era ampla estrada que se abríra desde a rua de Gileanes até S. Domingos. As paredes desta adelgaçavam-se rapidamente. Para a banda da Mouraria e da Pedreira os becos e encruzilhadas apinhavam-se de gente, e os reflexos dos ferros das ascumas populares, que erguidas scintillavam ao sol, começaram a descer e a sumir-se como as luzinhas das bruxas em sitio brejoso aos primeiros assomos do alvorecer. Fernão Vasques olhou em redor de si: estava só. Descórou; mas ficou immovel.

Entretanto o tropear aproximava-se cada vez com mais alto ruído: os bésteiros do concelho, postados ao longo dos paços do almirante, eram