Página:Lendas e Narrativas - Tomo II.djvu/115

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tedio, em que o existir é uma carga pesada, porque nos falta um alicerce em que possamos firmar-nos; porque fluctuamos sobre as nevoas densas do duvidar de tudo.

O materialismo incredulo já tirou das phases espirituaes dos altos engenhos argumento contra a immortalidade. Com a sua logica miope persuadiu-se de que via as enfermidades e a decadencia da alma acompanharem as enfermidades e a decadencia do corpo; que via o entendimento cachetico esmorecer com a decrepidez; quiz que elle na morte ficasse perdido e annullado entre as cinzas da sepultura. Se o materialismo soubesse que a vida das summas intelligencias é a poesia, e que essa vida segue a ordem inversa do desinvolvimento physico; se conhecesse que a energia intima tem o seu apogeu nos annos debeis da infancia, e começa a desvanecer-se quando os orgãos se fortalecem, elle não teria achado a explicação do phenomeno nas suas tristes doutrinas. Nos destinos eternos dos homens iria encontrar a razão desse facto, que então veria á sua luz verdadeira. Os olhos da alma vão-se pouco a pouco ennevoando no meio das trevas do mundo: nesta atmosphera grosseira e corrupta ella resfolga a custo, e com o diminuir dos alentos diminuem-se-lhe successivamente os brios: cada dia