Página:Lourenço - chronica pernambucana (1881).djvu/162

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e mortal; requeria toda a atenção e cuidado. Por isso, aqueles dois entes, que parecia dedicarem igual afeto ao doente, não consentiam em deixá-lo entregue somente a si.

Por volta da meia-noite, taciturno, pálido, os olhos encovados, João Mateus mandou que a rapariga o deixasse só com o enfermo. Ela obedeceu, levando os olhos cheios de lágrimas.

Na sala da frente havia um oratoriozinho com alguns santos. Estava aberto; um candeeiro de metal esclarecia-o com sua luz amarelenta, quase lúgubre. Bernardina ajoelhou-se diante dos santos, e fez uma promessa a S. Sebastião, que se via preso a uma árvore, tendo o corpo flechado, segundo reza a crônica, por selvagens. Feita a promessa, a rapariga retirou-se, cheia de esperança e fé, ao interior da casa.

Enquanto esta cena de piedade, que estava no espírito daqueles tempos, e ainda se pratica no seio de muitas famílias, se passava na sala, o fazendeiro, levado por idêntico sentimento religioso, propunha no quarto ao enfermo a confissão, nestas palavras:

— Lourenço, poderás confessar-te?

Abrindo os olhos a custo, o matuto respondeu com voz pesarosa:

— Quem é que me há de confessar?

— O que te pergunto - retorquiu o fazendeiro, é se podes cumprir este dever de todo bom cristão.