Página:Lourenço - chronica pernambucana (1881).djvu/181

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vendo aproximar-se o bando, tentaram a fuga, quase pagaram com a vida esta dedicação à senhora de engenho. Animais, móveis, jóias, tudo quanto representava qualquer valor, foi irremissivelmente seqüestrado. O sargento-mor, embora falecido, estava indiciado em crime de primeira cabeça; todos os seus haveres deviam ser confiscados para a coroa, nos termos da tenebrosa Ord. do Liv. 5º. Era isto o que dizia o executor, era isto o que repetiam, vociferando irados, os sequazes, dignos daquela legislação de sangue e rapina, que os tempos justificava, mas não enobreciam.

Logo que recebeu a intimação para despejar o sobrado, D. Damiana, voltando-se ao santuário, que ainda se via em cima de uma mesa, pôs os olhos na imagem de sua devoção, e, traindo a amargura que lhe ia na alma, disse:

— Para onde hei de ir, Virgem da Conceição?

Uma resposta amiga não se fez esperar:

— Para a minha casa, sinhá D. Damiana, para minha casinha, que há de ter muita honra em recebê-la.

A senhora de engenho, enternecida, caiu nos braços de Marcelina.

— Bem sei - prosseguiu a cabocla - que ela, à vista deste palácio, não merece que vosmecê volte para ela os olhos; está na mesma esteira dos mocambos dos negros fugidos... Mas terá lá uma escrava para olhar por vosmecê, e dar-lhe água para os pés.