Página:Lourenço - chronica pernambucana (1881).djvu/204

Wikisource, a biblioteca livre

do vulto do sargento-mor, o que surgiu na fantasia do rapaz, foi a imagem da viúva, conjunto de perfeições humanas. Deitar-se na mesma cama onde ela se deitava, afigurou-se-lhe o mesmo que ter a gentil viúva ao seu lado. A intimidade com um objeto de pessoa que consideramos acima de nós, parece dar-nos a intimidade com o próprio dono dele: abate as barreiras, enche os abismos que nos separam.

Ilusão ou fenômeno natural, Lourenço sentiu-se imediatamente outro. Acenderam-se-lhes as paixões, determinando-lhe estremecimentos nervosos. Ofegava, como se a imagem da formosa mulher fora uma realidade, e esta ali estivera com o calor, a suavidade da pele, a voluptuosidade do amplexo e do ósculo, produzindo nele a excitação, ou antes estimulando-lhe as sufocantes ambições da carne. Lourenço pensou em tudo o que a natureza põe nas formas da mulher bela para adoçar no homem, por instantes, as agruras deixadas pelo trabalho, que é a sua lei fatal, pela inveja dos outros homens, pelas injustiças da sociedade, enfim pelas misérias da comunhão exterior, que, se em certos casos protege e ampara, em outros gera crenças veneráveis, destrói incentivos nobres, desnorteia e avilta afetos que devia encaminhar e ajudar a subir, bafeja ruins paixões que desenvolve indiretamente, comunica a bons corações o vírus da sua perfídia, ensina maus caminhos pelo seu exemplo,