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essas palavras se precipitavam dos lábios de Lúcia, em tropel e quase sem nexo. Às vezes de tão rápidas que vinham lhe tomavam a respiração, e parecia que a estrangulavam. Até que por fim um soluço cortou-lhe a voz; o seio ofegou como se o coração lhe quisesse saltar com o último grito de indignação de sua alma ofendida.

Que responder àquela lógica inflexível da paixão fazendo justiça aos prejuízos sociais? Nada. Calei-me, irritado contra os estímulos nobres que recebemos na infância e não nos permitem praticar cientemente um ato de que devamos corar.

— Tu me fazes arrepender da minha franqueza, Lúcia! disse passado um momento. Preferias que deixasse de ver-te?

— Não! Antes assim! O senhor quer... Será feita a sua vontade! Terei amantes!

Saiu arrebatadamente e fechou-se no toucador.

Voltei, refletindo se o que tinha feito era realmente uma ação digna, ou uma refinada cobardia; servilismo à inveja e malevolência social, que se decora tantas vezes com o pomposo nome de opinião pública.

Às três horas da tarde passando pela Rua do Ouvidor vi Lúcia na casa do Desmarais, cercada por uma grande roda, na qual eu distingui logo o Sr. Couto e o Cunha.

Lúcia estava rutilante de beleza; a sua formosura tinha nesse momento uma ardentia fosforescente que eu atribuí à irritação nervosa da manhã. O orgulho e o desprezo vertiam-Ihe de todos os poros, nos olhos, nos lábios, nas faces e no porte desenvolto. Ela flutuava numa atmosfera maléfica para o coração, que, entrando naquela zona abrasada, sentia-se asfixiar. A roda elegante festejava o