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quanto mais vivos são os raios da luz que o fere, nada disto faz esquecer a manhã de ontem!

— Ora! Há tanta mulher bonita! Qualquer destas vale mais do que eu, acredite! Demais, quando tiver bebido alguns copos de clicot e sentir-se eletrizado, saberá o senhor de quem são os lábios que toca? Qual? É uma mulher! Uma presa em que ceva o apetite! Que importa o nome? Sabe porventura o nome das aves e dos animais que lhe preparam esta ceia? Conhece-os?... Nem por isso as iguarias lhe parecem menos saborosas.

Estas palavras, assim lidas friamente, nada são comparadas com a voz amarga e sibilante que as pronunciava. Soltavam-se de seus lábios, e caíam no meu espírito, tão impregnadas de ondas de sarcasmo, que deixavam passando uma impressão cáustica e dolorosa.

— Não fales assim, Lúcia. Podia responder-te com a tua mesma comparação. Estas gelatinas e massas delicadas sabem que paladar as tem de gozar? Nem por isso deixam de exalar os mesmos aromas e guardar igual sabor para o dono da casa, como para qualquer dos convidados.

— Ou para os criados a quem se atiram os sobejos da ceia?... Não cuide que me ofendo! Se o senhor não diz por que é delicado, pensa-o talvez!

— Mudemos de conversa. Este tom de ironia me incomoda. Deste-me uma hora de prazer, que não esquecerei nunca. Não apagues o perfume desta lembrança.

— Que mal faz? Comprará outras horas de igual prazer: custam-lhe tão pouco!

— Oh! não seria o mesmo, não!

— Já não teria o encanto da novidade?