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A rasão deste dito salta aos olhos;
O que frades, outr'ora, não fizessem
Incumbir ao diabo era debalde:
E as chronicas referem muitos casos
De quináos, que ao diabo os frades deram.
Mas verdade verdade, o frade de hoje,
Labéo das frias cinzas de Epicuro,
Não chega ao calcanhar do velho frade.»

Repetindo em voz alta estas blasphemias,
Os olhos affinquei n'um poento quadro,
Meu fiel companheiro no deserto
Em que a mão da fortuna me lançára.

O quadro figurava um frei Rotundo,
Nutrido e nédio, rindo-se á sorrélfa
Da feia carantonha do diabo,
Que raivoso mordia um par de dados.

Mingúa a humanidade a pouco e pouco!
Já se não topa mais um frei Bojudo
Estillando gordura ao sol em pino.
Que ditosa panella, a de outros tempos,
Onde cahisse o lenço de Alcobaça
Que limpasse o cachaço de algum frade!
Sahia a olha convertida em banha.
Hoje o frade, sequer, sabe o Larraga
Ou Brillat-Savarin. Dantes o frade
Era um poço ambulante de sciencias.
E os costumes? e o lar? se bem me lembro,