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Soltam prégas de um turbante,
A bôcca lhe vão tapar;
Tres a tomaram nos braços…
Nem mais um ai pôde dar.

Criados da sua casa,
Nenhum veio a seu chamar;
Ou peitados ou captivos
Não n'a podem resgatar.

São sette os moiros que entraram,
Sette os estão a aguardar;
Não fallam nem uns nem outros…
E prestes, a cavalgar!

So um, que de arção a toma,
Parece aos outros mandar…
Junctos junctos, certos certos,
Galopa a bom galopar!

Toda a noite, toda a noite
Vão correndo sem cessar;
Pelos montes trote largo,
Por valles a desfilar.

Nos ribeiros — peito n'agua,
Chape, chape, a vadear!
Nas defesas dos vallados
Up! salto — e a galgar!

Vai o dia alvorecendo,
Estão á beira do mar.
Que rio é este tam fundo
Que n'elle vem desaguar?

A bôcca ja tinha livre,
Mas não acerta a fallar
A pasmada da rainha…
Cuida ainda de sonhar!

— «Rio Doiro, rio Doiro,
Rio de mau navegar,
Dize-me, essas tuas aguas
Aonde as foste buscar?

«Dir-te-hei a perola fina
Aonde eu a fui roubar.
Ribeiros correm ao rio,
O rio corre a la mar,

«Quem me roubou minha joia,
Sua joia lhe fui roubar.»
O moiro que assim cantava,
Gaia que o estava a mirar…

Quanto o mais mirares, Gaia,
Mais formoso o hasde achar.
— «Quantos barcos alli véem!»
— «Barcos que nos véem buscar.»
— «Que lindo castello aquelle!»
— «É o do moiro Alboazar.»