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III

Por Deus vos digo, romeiro,
Que vos queirais levantar;
Minhas mãos não são reliquias,
Basta de tanto beijar!»

O romeiro não se erguia,
As mãos não lhe quer largar;
Os beijos uns sôbre os outros
Que era um nunca acabar.

Ia a infadar-se a rainha,
Ouviu-o a soluçar,
E as lagrymas, quatro e quatro,
Nas mãos sentia rollar:

— «Que tem o bom do romeiro
Que lhe dá tanto pezar?
Diga-me las suas penas
Se lh'as posso alliviar.»

— «Minhas penas não são minhas,
Que aos mortos morre o penar:
Mas a vida que eu perdi
Em vós podia incontrar.

«Minhas penas não são minhas,
Senão vossas, mal pezar!
Que uma rainha christan
Feita moira vim achar…»