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NEGRINHA 11

aos quatro annos, ficou para alli, feita um gato sem dono, levada a ponta-pés. Não comprehendia a idéa dos grandes. Batiam-lhe sempre, por acção ou omissão. A mesma coisa, o mesmo acto, a mesma palavra provocava, ora risadas, ora castigos. Aprendeu a andar, mas não andava, quasi. Com pretexto de que ás soltas reinaria no quintal, estragando as plantas, a boa senhora punha-a na sala, ao pé de si, num desvão de porta.

— Sentadinha ahi, e bico, hein ?

Negrinha immobilizava-se no canto horas e horas.

— Braços cruzados, já, diabo !

Cruzava os bracinhos, a tremer, sempre com o susto nos olhos. E o tempo corria. O relogio batia uma, duas, tres, quatro, cinco horas—um cuco tão engraçadinho! Era seu divertimento vel-o abrir a janella e cantar as horas com a boccarra vermelha, arrufando as azas. Sorria-se, então, feliz, um momento.

Puzeram-na depois a fazer crochê, e as horas se lhe iam a espichar trancinhas sem fim.