Página:O Crime do Padre Amaro.djvu/268

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que morre sem o sentir... Diz que há-de gemer, gemer, e de repente acabar como um passarinho...

— Seja feita a vontade de Deus, murmurou gravemente o padre Amaro.

Voltaram à sala de jantar. Toda a casa estava silenciosa: fora ventava forte. Havia muitas semanas que não se encontravam assim sós. Muito embaraçado, Amaro aproximou-se da janela: Amélia encostou-se ao aparador.

— Vamos ter uma noite de água, disse o pároco.

— E está frio, disse ela, encolhendo-se no xale. Eu tenho estado passada de medo...

— Nunca viu morrer ninguém?

— Nunca.

Calaram-se - ele imóvel ao pé da janela, ela encostada ao aparador, de olhos baixos.

— Pois está frio, disse Amaro, com a voz alterada da perturbação que lhe ia dando a presença dela àquela hora da noite.

— Na cozinha está a braseira acesa, disse Amélia. É melhor irmos para lá.

— É melhor.

Foram. Amélia levou o candeeiro de latão: e Amaro, indo remexer com as tenazes o brasido vermelho, disse:

— Há que tempo que eu não entro aqui na cozinha... Ainda tem os vasos com os raminhos fora da janela?

— Ainda, è um craveiro...

Sentaram-se em cadeirinhas baixas, ao lado da braseira. Amélia, inclinada para o lume, sentia os olhos do padre Amaro devorá-la silenciosamente. Ele ia falar-lhe, decerto! Tinha as mãos a