Página:O Crime do Padre Amaro.djvu/357

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de ambos; e até ao fim da noite foram marcando os seus cartões, muitos calados, com as faces acesas, sob a pressão brutal do mesmo desejo.

Enquanto as senhoras se agasalhavam, Amélia aproximou-se do piano para correr uma escala, e Amaro pôde murmurar-lhe ao ouvido:

— Oh filhinha, que te quero tanto! E não podermos estar sós...

Ela ia responder - quando a voz de Natário, que se embrulhava no seu capote ao pé do aparador, exclamou, muito severa:

— Então as senhoras deixam andar por aqui semelhante livro?

Todos se voltaram, na surpresa que dava aquela indignação, a olhar o largo volume encadernado que Natário indicava com a ponta do guarda- chuva, como um objeto abominável. D. Maria da Assunção aproximou-se logo de olho reluzente, imaginando que seria alguma dessas novelas, tão famosas, em que se passam coisas imorais. E Amélia chegando-se também, disse, admirada de tal reprovação: .

— Mas é o Panorama... É um volume do Panorama...

— Que é o Panorama vejo eu, disse Natário, com secura. Mas também veio isto. - Abriu o volume na primeira página branca, e leu alto: - "Pertence-me este volume a mim, João Eduardo Barbosa, e serve-me de recreio nos meus ócios". Não compreende, hem? Pois é muito simples... Parece incrível que as senhoras não saibam que esse homem, desde que pôs as mãos num sacerdote, está ipso facto excomungado, e excomunga- dos todos os objetos que lhe pertencem!