Página:O Crime do Padre Amaro.djvu/422

Wikisource, a biblioteca livre

sacerdote! Na Pérsia, na Etiópia, um simples padre tinha o privilégio de destronar os reis, dispor das coroas! Onde havia uma autoridade igual à sua? Nem mesmo na corte do Céu. O padre era superior aos anjos e aos serafins - porque a eles não fora dado como ao padre o poder maravilhoso de perdoar os pecados! Mesmo a Virgem Maria, tinha ela um poder maior que ele, padre Amaro? Não: com todo o respeito devido à majestade de Nossa Senhora, ele podia dizer com S. Bernardino de Sena: "O sacerdote excede-te, ó mãe amada!" - porque, se a Virgem tinha encarnado Deus no seu castíssimo seio, fora só uma vez, e o padre, no santo sacrifício da missa, encarnava Deus todos os dias! E isto não era argúcia dele, todos os santos padres o admitiam...

— Hem, que te parece?

— Oh, filho! murmurava ela pasmada, desfalecida de voluptuosidade.

Então deslumbrava-se com citações venerandas: S. Clemente, que chamou ao padre "o Deus da Terra"; o eloquente S. Crisóstomo, que disse "que o padre é o embaixador que vem dar as ordens de Deus". E Santo Ambrósio que escreveu: "Entre a dignidade do rei e a dignidade do padre há maior diferença que a que existe entre o chumbo e o ouro!"

— E o ouro é cá o menino, dizia Amaro com palmadinhas no peito. Que te parece?

Ela atirava-se-lhe aos braços, com beijos vorazes, como para tocar, possuir nele o "ouro de Santo Ambrósio", o "embaixador de Deus", tudo o que na Terra havia mais alto e mais nobre, o ser que excede em graça os arcanjos!