Página:O Crime do Padre Amaro.djvu/470

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— Tenho muita pressa, tenho, respondia ela muito séria, que a vergonha é para mim.

Ele calava-se; e havia tanto ódio como amor nos beijos que lhe dava - àquela mulher que se resignava assim tão facilmente a ir dormir com outro!



Tinha ciúmes dela - que lhe tinham vindo ultimamente desde que a vira conformar-se àquele casamento odioso! Agora, que ela já não chorava, começava a enfurecer-se da falta das suas lágrimas; e secretamente desesperava-se dela não preferir a vergonha com ele à reabilitação com o outro. Não lhe custaria tanto se ela continuasse a barafustar, a fazer um alarido de prantos; isso seria uma prova séria de amor, em que a sua vaidade se banharia deliciosamente; mas aquela aceitação do escrevente agora, sem repugnância e sem gestos de horror, indignava-o como uma traição. Viera a suspeitar que a ela no fundo não lhe desagradava a mudança. João Eduardo por fim era um homem; tinha a força dos vinte e seis anos, os atrativos dum belo bigode. Ela teria nos braços dele o mesmo delírio que tinha nos seus... Se o escrevente fosse um velho consumido de reumatismo, ela não mostraria a mesma resignação. Então, por vingança de padre, para "lhe desmanchar o arranjo", desejava que João Eduardo não aparecesse: e muitas vezes, quando a Dionísia lhe vinha dar conta dos seus passos, dizia-lhe com um mau sorriso:

— Não se canse. O homem não aparece. Deixe lá... Não vale a pena ganhar dor de peito...