Página:O Crime do Padre Amaro.djvu/552

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padre (não um abade Ferrão), sentia a sua velha alma indefesa exposta a todas as audácias de Satanás: a visão singular que tivera de S. Francisco Xavier nu, repetia-se agora com uma insistência pavorosa a respeito de todos os santos: era toda uma corte do Céu, arrojando túnicas e hábitos, e bailando-lhe na imaginação sarabandas em pêlo: e a velha estava morrendo da perseguição destes espetáculos dispostos pelo demônio. Reclamara o padre Silvério, mas parecia que um reumatismo geral tolhia todo o clero diocesano; desde o princípio do Inverno o Silvério estava também de cama. O abade da Cortegassa, chamado urgentemente, veio - mas para lhe comunicar a receita nova que descobrira de fazer bacalhau à biscainha... Esta falta dum padre virtuoso dava-lhe um humor feroz, que recaia sobre Amélia numa chuva de impertinências.

E a boa senhora estava pensando seriamente em mandar a Amor pelo padre Brito - quando uma tarde, ao fim do jantar, inesperadamente, o senhor pároco apareceu!

Vinha magnífico, trigueiro do sol e do ar do mar, de casaco novo e botins de verniz. E palrando longamente acerca da Vieira, dos conhecidos que estavam, da pesca que fizera, dos soberbos quinos, fazia passar naquele triste quarto de doente velha todo um sopro vivificante da vida divertida à beira-mar. D. Josefa tinha duas lágrimas nas pálpebras do gozo de ver o senhor pároco, de o ouvir.

— E a mamã passa bem, disse ele a Amélia. Já tem os seus trinta banhos. Ganhou outro dia quinze tostões a uma batotinha que se arranjou... E por cá que têm feito?