Página:O Crime do Padre Amaro.djvu/598

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e na Barrosa, foi engorolando à pressa as cerimônias: soprando em cruz sobre a face do pequerrucho, para expulsar o Demônio que já habitava aquelas carninhas tenras; impondo-lhe o sal sobre a boca, para que ele se desgostasse para sempre do sabor amargo do pecado e tomasse gosto a nutrir-se só da verdade divina; tocando-o com saliva nas orelhas e nas narinas, para que ele não escutasse jamais as solicitações da carne e jamais respirasse os perfumes da terra. E em roda, com tochas na mão, os padrinhos, os convidados, na fadiga que davam tantos latins rosnados à pressa, só se ocupavam do pequeno, num receio que ele não respondesse com algum desacato impudente às tremendas exortações que lhe fazia a Igreja sua Mãe.

Amaro, então, pondo de leve o dedo sobre a touquinha branca, exigiu do pequerrucho que ele, ali em plena Sé, renunciasse para sempre a Satanás, às suas pompas e às suas obras. O sacristão Matias, que dava em latim as respostas rituais, renunciou por ele - enquanto o pobre pequerrucho abria a boquinha a procurar o bico da mama. Enfim o pároco dirigiu-se à pia batismal seguido de toda a família, das velhas devotas que se tinham juntado, de gaiatos que esperavam uma distribuição de patacos. Mas foi toda uma atrapalhação para fazer as unções: a parteira comovida não atinava a desapertar os laçarotes do chambre, para pôr a nu os ombrozinhos, o peito do pequeno; a madrinha quis ajudá-la; mas deixou escorregar a tocha, alastrou de cera derretida o vestido duma senhora, uma vizinha dos Guedes, que ficou embezerrada de raiva.