Página:O Dominio Publico no Direito Autoral Brasileiro.pdf/105

Wikisource, a biblioteca livre
O domínio público no direito autoral brasileiro
– Uma Obra em Domínio Público –

Historicamente, não se reconhece a existência dos direitos autorais (ao menos da forma como são atualmente concebidos) na Idade Antiga[1], ainda que os gregos reconhecessem a autoria de seus filósofos[2] e outros traços de direito autoral possam ser encontrados ancestralmente. Foi apenas a partir do surgimento da prensa mecânica, em meados do século XV[3], que a discussão acerca dos direitos autorais passou a ter fronteiras mais visíveis[4].

É bem verdade que há quem veja na cobrança pela igreja católica, durante a Idade Média, por cópias de manuscritos, o embrião dos direitos autorais[5]. Parece-nos, entretanto, que é mesmo “com o aparecimento da imprensa que o direito de autor encontra fundamento para se desenvolver”[6].

89

  1. “Não se reconhece o direito autoral no Direito romano escrito, embora haja evidências de que alguns autores assinavam contratos de ‘publicação’ com livreiros”. Tradução livre do autor. No original, lê-se que “[t]here is no recognition of a copyright in written Roman law, though there is evidence that some authors signed ‘publishing’ contracts with booksellers”. BETTIG, Ronald V. Copyrighting Culture – The Political Economy of Intellectual Property. Cit.; p. 12. Por outro lado, há quem pondere a respeito dos romanos que, contrariamente a uma opinião comumente admitida, [os romanos conheciam] a noção de obra do espírito: assim foram eles os pioneiros na distinção entre o suporte material e a obra no qual se encontra incorporada. GAUTIER, Pierre-Yves. Priopriété Littéraire et Artistique. Cit.; p. 16. Afirma, no original: “[l]es Romains connaissaient parfaitement, contrairement à une opinion couramment admise, la notion d’oeuvre de l’esprit : ainsi furent-ils les pionniers de la distinction entre le support matériel (mur, tablette) et l’oeuvre qui y est incorporée (peinture) (…)”. Para um apanhado histórico dos direitos autorais, ver SOUZA, Allan Rocha de. A Construção Social dos Direitos Autorais. Revista da ABPI, nº 93; pp. 11 e ss. Ver ainda GROSHEIDE, F. Willem. In Search of the Public Domain During the Prehistory of Copyright Law. Intellectual Property – The Many Faces of the Public Domain. Cheltenham: 2007; pp. 1 e ss.
  2. SOUZA, Allan Rocha de. A Construção Social dos Direitos Autorais. Cit.; p. 11.
  3. “[A] invenção da impressora, por Gutenberg em 1436, e do papel, em 1440, possibilitaram a reprodução dos livros em uma escala infinitamente superior ao conhecido então. Associada à facilidade de reprodução à alfabetização de um maior número de pessoas e a uma produção literária mais intensa e diversificada observa-se, então, um período de eclosão cultural – a Renascença – e, concomitantemente, de uma indústria cultural: os impressores e vendedores de livros, inicialmente na França”. SOUZA, Allan Rocha de. A Função Social dos Direitos Autorais. Cit.; p. 38.
  4. Para consistente análise histórica dos direitos autorais, ver, entre outros, MIZUKAMI, Pedro. Função Social da Propriedade Intelectual: Compartilhamento de Arquivos e Direitos Autorais na CF/88. Dissertação apresentada ao programa de pós-graduação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2007.
  5. “A Igreja detinha o monopólio sobre o conhecimento, especialmente durante a Alta Idade Média, por meio do controle de manuscritos e suas cópias e por meio da educação e, consequentemente, alfabetização. Após os mosteiros beneditinos terem desenvolvido métodos de emprestar e trocar manuscritos, logo descobriram o valor de suas bibliotecas. Acesso aos manuscritos poderia comandar terra, gado, dinheiro ou outros privilégios. George Putnam [militar e escritor americano, 1844-1930] chamava a prática de cobrar pelo direito de copiar um manuscrito do primeiro direito autoral europeu, ainda que não tivesse ‘nada a ver com os direitos de um produtor original da produção literária”. Tradução livre do autor. No original, lê-se que: “[t]he Church held a monopoly on knowledge, especially during the Early Middle Ages, through its control of manuscripts and their reproduction and through control of education and, consequently, litteracy. As the Benedictine monasteries developed methods for loaning and exchanging manuscripts, they soon discovered the value of their libraries. Access to manuscripts could command land, cattle, money, or other privileges. George Putnam called the practice of requiring payment for the right to copy a manuscript the first European copyright, though one that had ‘nothing whatever to do with the rights of an original producer in the literary production’”. BETTIG, Ronald V. Copyrighting Culture – The Political Economy of Intellectual Property. Cit.; p. 13.
  6. CARBONI, Guilherme. Função Social do Direito de Autor. Curitiba: Juruá Editora, 2008; p. 50.