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O domínio público no direito autoral brasileiro
– Uma Obra em Domínio Público –

Tempo e espaço, portanto, em regra servem de impedimento a uma comparação perfeita de um determinado instituto jurídico em momentos históricos distintos ou entre sistemas jurídicos diversos[1].

Do ponto de vista jurídico-linguista, alguns exemplos podem ser esclarecedores. É Rodolfo Sacco quem comenta acerca do anteprojeto de um código comercial internacional e cujo art. 2º falava em contract e contrat. Afirma o autor[2]:

 
Como é sabido, contract e contrat não são a mesma coisa. O ato bilateral destinado à transferência de uma propriedade imobiliária, ou à substituição de uma garantia mobiliária, e também a convenção para a gestão de um bem por parte de um testa-de-ferro são contrats na França, mas não são contracts na Inglaterra e nos Estados Unidos da América do Norte (abrangidos, ao invés, no conceito de conveyance, ou de trust).
A formulação do anteprojeto apresentava aos seus autores problemas que não podiam ser resolvidos no plano da tradução. A língua inglesa não conhece um termo para indicar o contrat, e a língua francesa, por sua vez, não possui um equivalente a contract. A dificuldade seria resolvida caso se decidisse assumir os termos contract e 'contrat no significado genérico de “acordo que tem por objeto relações jurídicas”. Neste caso, porém, o texto deveria esclarecer quais elementos devem acrescentar-se ao acordo para que este recaia nas hipóteses previstas no texto legal e vincule as partes.
 

E mais adiante, comenta, ponderando[3]:

 
Se a distinção entre contract e contrat recai em uma diferença de conceitos, felizmente a situação não é tão grave cada vez que as regras jurídicas diferem. Obligation de donner e obligation to transfer a property são expressões linguísticas intercambiáveis, ainda que na França a obligation de donner produza automaticamente a transferência da propriedade (art. 1138 do Code Napoléon), e na Inglaterra a fattispecie produza somente o nascimento da obrigação, e de um equitable interest em favor do credor. Estamos diante de regras jurídicas diversas, mas as categorias, e, com elas, os vocábulos, correspondem.
 

Algumas possíveis soluções são apontadas para se superar as barreiras linguísticas. É possível renunciar à tradução, mantendo os termos em sua língua original; é possível traduzir individualizando as diferenças entre o termo original e o traduzido e, finalmente, é possível criar, em sua própria língua, um neologismo adequado. O que é indispensável

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  1. CONSTANTINESCO atribui a Montesquieu um certo “diletantismo” na elaboração de seu “Espírito das Leis” exatamente por conta de algumas simplificações que distorcem a realidade. “Assim, por exemplo, procura elaborar os sistemas partindo de um número limitado de ideias principais, frequentemente muito genéricas e não suficientemente demonstradas. Compara elementos não comparáveis porque pertencentes a povos e a histórias muito diversas”. CONSTANTINESCO, Leontin-Jean. Tratado de Direito Comparado – Introdução ao Direito Comparado. Cit.; p. 84.
  2. SACCO, Rodolfo. Introdução ao Direito Comparado. Cit.; pp. 55-56.
  3. SACCO, Rodolfo. Introdução ao Direito Comparado. Cit.; p. 56.