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Sérgio Branco

é que o comparatista, traduza ou não, “não pode transferir uma noção de um sistema estranho ao próprio sistema conceitual sem tomar certas precauções. Ele deve, isto sim, buscar nas regras operacionais os denominadores comuns dos diversos sistemas conceituais, para avaliar divergências e concordâncias”[1].

Como se percebe facilmente, o direito comparado exige muito mais do que a simples comparação entre dispositivos jurídicos.

É possível afirmar que “a comparação tem natureza oposta à da dogmática: esta propõe definições; aquela se mede com dados reais”[2]. Rodolfo Sacco pergunta: “é possível comparar um sistema [jurídico] com outro sistema?” E admite que são duas as respostas possíveis[3]:

 
Deveriam obviamente duvidar aqueles para quem comparar significava apenas evidenciar a unidade substancial das soluções. Deveriam obviamente duvidar aqueles para quem comparar significava apenas predispor à unificação do direito.
A resposta será afirmativa para aqueles que concebem a comparação como a verificação e a medida das diferenças existentes entre as várias soluções jurídicas[4].
 

Para Rodolfo Sacco, o comparatista deve se dedicar a analisar o genótipo (= noção superabstrata) do conceito, enquanto que o fenótipo seria a manifestação empírica, estudado em sede da análise dogmática no ordenamento interior de cada país[5].

Por isso é que antes mesmo de o direito comparado “revelar” o resultado da comparação entre dois ordenamentos jurídicos, servirá como forma de leitura do próprio direito, pois que a comparação “revela” o direito nacional ao jurista pátrio[6]:


  1. SACCO, Rodolfo. Introdução ao Direito Comparado. Cit.; pp. 66-67.
  2. SACCO, Rodolfo. Introdução ao Direito Comparado. Cit.; p. 78. “Certamente é plausível que a comparação se manifeste de forma prazerosa na análise a respeito da jurisprudência. Se o método dogmático leva à simplificação do direito reduzindo-o à formula doutrinária, a comparação coloca no centro do palco os dados efetivos. Ela é uma ciência histórica que se dedica àquilo que é real, de conformidade com o critério de validação de Vico, verum ipsum factum. Por isso é de se esperar que o comparatista não se descuide de dirigir a sua atenção para os dados da prática judiciária. Mas o problema do método comparatístico não pode reduzir-se à atenção do dado jurisprudencial. O comparatista não se limita a reduzir o direito a sentenças: ele sabe muito bem que a sentença, mesmo mantendo, através das fronteiras, uma natureza constante de ato jurisdicional, assume, no entanto, conotações diversas nos países de direito judicial e nos de direito legislado”. SACCO, Rodolfo. Introdução ao Direito Comparado. Cit.; p. 79.
  3. SACCO, Rodolfo. Introdução ao Direito Comparado. Cit.; p. 44.
  4. O autor comenta, exemplificando: “[o]s juristas da área socialista sentiram-se compelidos a contestá-la, pelo temor que se estudasse o seu sistema lendo-se em filigrana a regra romanística, por temor de que o intérprete denegrisse o direito ocidental frente ao soviético, ou por temor que se negasse o caráter revolucionário das mudanças operadas por Lênin e depois dele. Mas além destas preocupações, permanece o fato de que os vários sistemas são comparáveis, não porque sejam mais ou menos afins ou análogos, mas porque a comparação não teme as diferenças, por maiores que sejam. Aqueles juristas que negavam a comparabilidade dos sistemas jurídicos correspondentes a sistemas sociais opostos porque aqueles sistemas jurídicos são basilarmente diversos traçavam, sem sabê-lo, uma verdadeira e autêntica comparação” (grifos no original). SACCO, Rodolfo. Introdução ao Direito Comparado. Cit.; p. 45.
  5. SACCO, Rodolfo. Introdução ao Direito Comparado. Cit.; pp. 61-62.
  6. Grifos no original. SACCO, Rodolfo. Introdução ao Direito Comparado. Cit.; p. 163.

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