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Capítulo 3
O domínio público no Brasil — estrutura e função

 

3.1. Natureza jurídica

 

Antes de ingressarmos na análise da estrutura e da função do domínio público no direito autoral brasileiro, cabe traçar os conceitos fundamentais de domínio público, com a identificação de sua natureza jurídica. No primeiro capítulo, pudemos observar que o domínio público relativo aos direitos autorais muito se diferencia do domínio público a que se refere o direito administrativo.

A LDA prevê que os direitos autorais são, para os efeitos legais, tratados como bens móveis[1]. Mas qual a natureza do domínio público no direito autoral? A questão é controvertida e tem levantado diversas respostas ao longo dos últimos séculos. Já vimos que pelo menos em 1791, em razão de texto legal publicado na França, a natureza do domínio público no direito autoral foi expressamente indicada: seria propriedade pública.

No entanto, tal classificação não se sustenta no Brasil contemporâneo porque os bens em domínio público (no sentido do direito autoral) não pertencem ao Estado (nem, stricto sensu, a todos, como se se tratasse de fato de propriedade, por meio da constituição de um condomínio), ainda que caiba a este a sua defesa. Além disso, é difícil justificar um direito de propriedade[2] sem exclusividade. Por isso, para qualificarmos adequadamente a natureza dos bens em domínio público, precisamos nos valer de outros elementos externos ao direito de  propriedade.

Para o CCB, os bens são privados ou públicos. Afinal, prevê o art. 98 que “são públicos os bens do domínio nacional pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno; todos os outros são particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem”. As obras em domínio público, por tudo que já foi visto, não podem pertencer ao domínio privado. Por isso, precisam ser classificadas necessariamente como bens  públicos.

Os bens públicos estão indicados no art. 99 do CCB, que determina:

 

Art. 99. São bens públicos:

I — os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças;


  1. Art. 3º: Os direitos autorais reputam-se, para os efeitos legais, bens móveis.
  2. Karin Grau-Kuntz chega a criticar a denominação “domínio público”, uma vez que “o ‘domínio público', em relação às obras intelectuais, não representa ‘domínio' algum, mas antes, e seguindo a lição de José de Oliveira Ascensão, nada mais é do que uma ‘liberdade coletiva'. Nesse sentido, o ideal seria adotar outra expressão para descrever esta liberdade coletiva”. GRAU-KUNTZ, Karin. Domínio Público e Direito de Autor. No prelo.