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O domínio público no direito autoral brasileiro
– Uma Obra em Domínio Público –

conta do fato, o que acarretou a negativa do pedido da documentarista? Não, o caso é ainda mais grave.

A LDA, aprovada em fevereiro de 1998, entrou em vigor em junho do mesmo ano. Até então, havia vigorado a lei 5.988/73. Ao contrário da LDA, que prevê período de proteção de 70 anos, a lei anterior dispunha, em seu artigo 45, que “também de sessenta anos será o prazo de proteção aos direitos patrimoniais sobre obras cinematográficas, fonográficas, fotográficas, e de arte aplicada, a contar do 1° de janeiro do ano subsequente ao de sua conclusão” (grifamos).

Ora, sabendo-se que as fotografias haviam sido publicadas em 1937, o prazo de proteção começou a ser contado em janeiro de 1938. Sessenta anos depois, isto é, em janeiro de 1998, ainda estava em vigor a lei 5.988/73, que previa prazo de proteção de sessenta anos – que se esgotaram exatamente um mês antes da aprovação da LDA pelo Congresso Nacional. Dessa forma, as fotos que despertaram o interesse de Verena Kael e a levaram a ir à Biblioteca Nacional estão em domínio público desde 1998.

Conforme mencionado acima, segundo nossa lei autoral, uma vez que a obra entre em domínio público, pode ser utilizada por toda a sociedade, independentemente de autorização, licença ou pagamento de direitos autorais. É uma forma de se estimular a criação intelectual e diversos são os fundamentos para isso (tanto de ordem legal quanto de ordem social ou econômica). Por isso, a limitação ao uso de obras em domínio público é ato no mínimo abusivo. E, obviamente, é a última conduta que alguém espera de um dos órgãos públicos que mais deveriam estar preocupados com o acesso ao conhecimento, como é o caso da Biblioteca Nacional.

Isso significa que para o fornecimento da cópia da fotografia não se poderia cobrar qualquer valor? Não. Como se verá adiante, a cobrança pelo acesso é legalmente possível, mas é incompreensível que haja discriminação quanto ao uso que se pretende fazer da obra. Exceto por alguns poucos casos, o usuário pode fazer com a obra em domínio público o que quiser.

No entanto, é espantoso que a Biblioteca Nacional trate o domínio público com tão pouca deferência. Mas acreditamos que não seja uma conduta exclusivamente institucional. O domínio público vem sendo pouquíssimo estudado e muito mal compreendido. O caso aqui apresentado é apenas uma ilustração de como a falta de entendimento acerca da matéria pode gerar prejuízos culturais significativos.

Como síntese dos problemas levantados, podemos apontar:


a) Verena Kael não pôde obter cópia das fotos em um órgão que poderia licitamente tê-las fornecido, ainda que cobrando pelo acesso;


b) a Biblioteca Nacional fez distinção para o uso de obra em domínio público onde essa distinção legalmente não existe;

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