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O domínio público no direito autoral brasileiro
– Uma Obra em Domínio Público –

podemos citar as quotas das sociedades de responsabilidade limitada e as ações das sociedades anônimas. Nestes casos, tratam-se de bens também intangíveis, mas que não se encontram sujeitos à falha de mercado a que anteriormente nos referimos[1].

A segunda distinção importante entre a propriedade intelectual e as demais propriedades é que estas tendem à perpetuidade, enquanto que aquela tende a se extinguir com o tempo. A propriedade exercida sobre um imóvel ou sobre joias – ou ainda sobre bens sem qualquer valor comercial, mas de inestimável valor afetivo – podem (e frequentemente assim acontece) ser transmitidos de uma geração a outra, indefinidamente, pelo tempo que existir o bem material. O mesmo não acontece com os bens protegidos pela propriedade intelectual[2].

Direitos autorais, por exemplo, extinguem-se em regra 70 anos após o falecimento do autor. Já as patentes duram por 20 anos contados da data do depósito. Desenhos industriais podem vigorar pelo prazo máximo de 25 anos; programas de computador, por no máximo 50. Até mesmo as marcas podem deixar de gozar de proteção dependendo das circunstâncias. Assim é que, de modo geral, os bens intelectuais escapam aos limites da perpetuidade da propriedade. Ainda que o bem material onde a obra intelectual se encontra fixada continue a existir décadas depois de sua concepção e ainda que seu titular aufira grandes vantagens com a exploração econômica da obra, chegado o momento final do prazo de proteção legal, a obra intelectual ingressará em domínio público.

Daí se infere uma terceira distinção entre a propriedade intelectual e as demais propriedades. Todas as coisas corpóreas pertencem (ou podem pertencer) a alguém. Todo objeto de propriedade pode pertencer a um particular ou ao Estado; pode pertencer a uma ou a mais pessoas. A coisa sem dono – res nullius – pode vir a pertencer a alguém. O mesmo se dá com a coisa abandonada – res derelicta. No entando, decorrido o prazo de proteção conferido aos bens intelectuais, eles entram em domínio público e então não podem mais ser apropriados por quem quer que seja, nem pelo particular nem pelo Estado, ainda que a este incumba a sua defesa. A obra em domínio público não é – nem pode ser – propriedade de ninguém.

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  1. Afinal, mesmo sendo bens imateriais, são bens rivais – o exercício dos direitos decorrentes de sua titularidade por parte de um sócio impede o exercício dos direitos por outro sócio. Nesse aspecto, as ações, assim como as quotas das sociedades de responsabilidade limitada, se assemelham mais aos bens materiais do que àqueles sujeitos ao regime da propriedade intelectual. José Edwaldo Tavares Borba afirma quanto à natureza das ações: “[a] ação é uma unidade do capital da empresa, dando ao seu titular o direito de participar da sociedade, como acionista. É, portanto, um título de participação. Título no sentido amplo, com cártula ou sem cártula: quem é titular de uma ação tem uma unidade do capital, um título de participação na sociedade”. Por isso é que “[a] posição do acionista perante a sociedade não é a de um credor – ainda que se considere o vocábulo credor no seu sentido mais amplo. A posição é a de um participante, com direitos e deveres. O título de crédito não impõe deveres, mas só direitos e, em certos casos, algum ônus”. BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito Societário, 9ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004; pp. 207-210.
  2. Esta distinção também se presta a afastar os bens sujeitos à propriedade intelectual dos demais bens imateriais, como ações e quotas, que subsistem enquanto subsistir a sociedade empresária a que estão relacionados. A marca, entretanto, pode ser uma exceção quando comparada aos demais bens de propriedade intelectual.