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O domínio público no direito autoral brasileiro
– Uma Obra em Domínio Público –

(ou do titular dos direitos autorais) e a seguir do ponto de vista da sociedade (do usuário da obra intelectual).

Afirma a doutrina, de modo geral, que, para o autor, a exclusividade garantida pelos direitos autorais funciona como incentivo para a criação[1][2]. No entanto, não faz sentido essa proteção ser excessivamente longa. Primeiramente por uma questão lógica: se o objetivo conferido pela exclusividade é promover a criação, que criação se pode esperar de um autor morto, já que a proteção se estende – e muito – para além da vida do autor[3]? A seguir, porque a expectativa de compensação econômica por parte do autor dificilmente se cumpre após os primeiros anos de divulgação da obra. Ambas as considerações estão intrinsecamente conectadas.

Quanto ao primeiro aspecto, Ana Paula Fuliaro comenta que existe certa deturpação dos direitos patrimoniais, que garantirão “ao empreendedor exploração por período consideravelmente longo, fundamentado em proteção que tem como legítima justificativa a preocupação do criador intelectual com a subsistência dos seus familiares no caso de seu falecimento”[4]. A autora prossegue com sua análise ao sopesamento dos interesses quanto à proteção da obra intelectual[5]:


As razões desta proteção já foram especuladas, chegando-se à conclusão de que a norma visa a assegurar a necessária segurança financeira ao autor para que faça do desenvolvimento da arte seu ofício, garantindo-lhe, também, que sua família não estará imediatamente desamparada no caso de seu falecimento.

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  1. Ver, por todos, Antônio Chaves que, de maneira um tanto apoteótica, declara: “[o]nde houver criatividade, originalidade, aí estará, sempre solícito e solerte, o direito de autor, procurando dignificar e salvaguardar o trabalho do criador e do artista, a fim de que dele possam auferir meios de subsistência para continuar produzindo cada vez mais e melhor”. CHAVES, Antônio. Direito de Autor – Princípios Fundamentais. Cit.; p. 20.
  2. Não significa, entretanto, que toda a criação existirá por causa da expectativa de proteção. O ser humano cria desde muito antes da primeira lei de propriedade intelectual. Ainda hoje, sobretudo quando tratamos de obras colaborativas (como a enciclopédia virtual Wikipedia), torna-se evidente que a criação não se deu tanto por base o desejo de uma proteção nos moldes tradicionais. Afirmam Landes e Posner: “[a]pesar da ironia de Samuel Johnson ao afirmar que só os tolos não escrevem por dinheiro, sempre houve pessoas talentosas que escrevem ou compõem ou pintam mais por causa da satisfação pessoal do que por causa do rendimento econômico. Se a demanda por um determinado tipo de trabalho é pequena, os esforços de autores automotivados podem ser suficientes para satisfazê-la”. Tradução livre do autor. No original, lê-se que: “Despite Samuel Johnson’s quip that only fools don’t write for money, there have always been talented people who wrote or composed or painted because of the personal satisfaction it gave them rather than because of the pecuniary income that they obtained. If the demand for a class of work is small, the efforts of the self-motivated producers may be sufficient to satisfy it”. LANDES, William M. e POSNER, Richard A. The Economic Structure of Intellectual Property Law. Cit.; p. 65.
  3. Não há que se subestimar a matéria. Casos de obras psicografadas já foram objeto de análise pelo poder judiciário, sendo o mais célebre de todos o que discutiu a titularidade dos direitos autorais de obras atribuídas a Humberto de Campos.
  4. FULIARO, Ana Paula. A sucessão em direito de autor: aspectos morais e patrimoniais. Direitos Autorais – Estudos em Homenagem a Otávio Afonso dos Santos. São Paulo: ed. Revista dos Tribunais, 2007, p. 15.
  5. FULIARO, Ana Paula. A sucessão em direito de autor: aspectos morais e patrimoniais. Cit., p. 18.