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O domínio público no direito autoral brasileiro
– Uma Obra em Domínio Público –

mais cara que seja a aquisição do direito de adaptação, desde que o projeto se mostre rentável. O mais interessante é poder constatar que uma obra escrita há tanto tempo (a edição original de “Alice no País das Maravilhas” é de 1865) ainda tem força para atrair multidões quando adaptada para o cinema[1][2]. Não é porque obras em domínio público são muitas vezes antigas, datadas ou pertencentes a outra escola cultural (em razão do grande lapso de tempo entre sua criação e o momento em que ingressa em domínio público) que se pode dizer não terem mais apelo popular. Alguns sucessos de bilheteria são exemplos suficientes.

Mesmo que nos Estados Unidos, com sua bilionária produção cinematográfica, não se hesite em pagar pequenas fortunas para se obter o direito de transformar uma obra em sucesso comercial, é fundamental encararmos ainda a construção do domínio público como forma de criação de obras derivadas de maior ou menor porte.

Afinal, não são apenas as adaptações financeiramente bem sucedidas que nos servem de exemplo. Na verdade, as obras em domínio público permitem um grande exercício da criatividade. A peça shakespeareana “Romeu e Julieta” foi adaptada para o cinema pelo menos 50 vezes [3]. E mesmo tendo vivido cerca de três séculos antes da invenção do cinema, Shakespeare é creditado como “coautor” de cerca de 800 filmes baseados em suas peças. No momento, 11 filmes realizados a partir de obras do poeta inglês encontram-se em estágio mais ou menos avançado de produção e seis novas adaptações devem ser realizadas nos próximos anos[4].

Todos esses filmes podem ter sido – ou não – bem sucedidos em sua jornada comercial: pouco importa. Em primeiro lugar, o domínio público permitiu que as obras originais fossem adaptadas independentemente de pagamento de direitos autorais. Para Hollywood talvez isso faça pouca diferença, mas certamente é elemento fundamental em indústrias culturais menos abastadas. Em seguida, é possível, com obras em domínio público, explorar enredos que de algum modo já resistiram à passagem do tempo, que são razoavelmente conhecidos do grande público: trata-se, assim, de material em certa extensão já testado. Finalmente, é por meio do domínio público que o homem pode reciclar (remixa), com aproveitamento econômico, (quase) toda a cultura mundial.

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  1. É certo que o uso da tecnologia 3D contribuiu bastante para despertar o interesse do público, bem como a direção de Tim Burton e a presença de astros, como Johnny Depp. Ainda assim, de acordo com o website IMDB, o filme de Tim Burton já é a 20ª maior bilheteria de todos os tempos. Disponível em http://imdb.to/9v5bBb. Acesso em 04 de dezembro de 2010.
  2. Outros exemplos poderiam ser dados entre os campeões de bilheteria no cinema norte-americano. “A Christmas Carol”, filme de 2009, dirigido por Robert Zemeckis e baseado na novela escrita em 1843 por Charles Dickens, arrecadou mais de US$ 130,000.00, resultado também alcançado por “Troia”, filme baseado na antiquíssima narrativa épica de Homero, “A Ilíada”, escrita possivelmente antes do ano 1.000 anterior ao nascimento de Cristo . Disponível em http://www.imdb.com/boxoffice/alltimegross. Acesso em 02 de abril de 2010.
  3. Disponível em http://www.imdb.com/find?s=all&q=romeo+and+juliet. Acesso em 02 de abril de 2010.
  4. Disponível em http://www.imdb.com/name/nm0000636/. Acesso em 02 de abril de 2010. O já citado Charles Dickens aparece com cerca de 300 adaptações; Machado de Assis, cujas obras ingressaram em domínio público no final dos anos 1960, conta com 20 adaptações desde então.