Página:O Gaucho (Volume I).djvu/80

Wikisource, a biblioteca livre

o ginete à disparada: bastava-lhe um psiu.

Enfim o cavalo era para o gaúcho um próximo, não pela forma, mas pela magnanimidade e nobreza das paixões. Entendia ele que Deus havia feito os outros animais para vários fins recônditos em sua alta sabedoria; mas o cavalo, esse Deus o criara exclusivamente para companheiro e amigo do homem.

Tinha razão.

Se o homem é o rei da criação, o cavalo serve-lhe de trono. Veículo e arma ao mesmo tempo, ele nos suprime as distâncias pela rapidez, e centuplica nossas forças. Para o gaúcho, especialmente para o filho errante da campanha, esse vínculo se estreita.

O peixe careca d’água, o pássaro do ambiente, para que se movam e existam. Como eles, o gaúcho tem um elemento, que é o cavalo. A pé está em seco, faltam-lhe as asas. Nele se realiza o mito da antigüidade: o homem não passa de um busto apenas; seu corpo consiste no bruto. Uni as duas naturezas incompletas: este ser híbrido é o gaúcho, o centauro da América.