Página:O Hóspede.djvu/165

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dias, àqueles longos serões de músicas sem fim em que o espírito alegre e folgazão do Marcondes podia vagabundar pelos assuntos, animando a conversa, dando-lhe umas feições ao mesmo tempo séria e pilhérica, ajudando a gente a matar as horas enquanto não chegava o sono.

O Pedro mesmo, sem compreender o que se passava em si, começava a aborrecer-se do Marcondes. Já não eram mais aquelas grandes efusões dos primeiros dias, aquelas conversas que se prolongavam pela noite afora. Ele agora fazia-se mais discreto e menos comunicativo. Apenas, nas horas de refeição, sentindo o mal-estar que lentamente se apoderava de todos, procurava animar a conversação, dar-lhe uns aspectos de jovialidades. E como reconhecia-se fraco ele só para tamanha empresa procurava um apoio no Marcondes, tentando espicaçá-lo a fim de rir-se do eflúvio de palavras e teorias pândegas, com que o rapaz costumava responder a esta ordem de provocações. Ao princípio servira-se de uns meios brandos, de umas caçoadas ligeiras. Mais tarde encontrando-lhe, com grande pasmo seu, uma epiderme moral muito coriácea, fora gradativamente aumentando a intensidade dos seus ditos,