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O INFERNO
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o culpado e admoestam os espectadores; pelo contrario, as outras não corrigem o culpado e podem apenas admoestar os vivos que as conhecem: logo são menos prestantes e universaes e completas; falta-lhes aquella bemfazeja efficacia com que os deuses folgam de dulcificar as obras da sua justiça; digamol-o em pouco: são menos divinas.

Eis-ahi porque Platão é aváro das penas eternas e perdoa ao maximo numero de peccadores, descontando-lhes os gemidos, lavando-os e purificando-os em suas proprias lagrimas, á excepção dos oppressores dos povos, de seus cumplices e louvaminheiros que expressamente exclue da lei commum. Para estes é elle durissimo; eternisa-lhes as dores; todavia, os deuses não podem ser accusados por isso de inutilmente rigorosos.

De feito, se a tyrannia é o maior dos crimes, e o unico expiavel, é porque a liberdade, que ella anniquila, é o maior bem que os deuses nos doaram, unico impossivel de substituir; é porque, na sociedade escravisada, cessam os prazeres honestos, a verdadeira gloria, sabedoria e virtudes.

Tal é o senso intimo do castigo excepcional que Platão applica aos tyrannos. Bastantemente está explicado a superioridade do terrivel castigo; mas o que não se explica é a razão da sua perpetuidade. Platão suppunha-o eterno porque não sabia, como nós, que a humanidade tem que percorrer no tempo um circulo limitado, e que este universo ha de acabar. Eternisava