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O INFERNO
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militam questões moraes complicadas e de alto melindre, de interesse quotidiano e universal, questões que enliçam elevadissimos espiritos, e sobre as quaes devemos, por isso, interrogar a Egreja.

Se consultamos os canones dos concilios, e nomeadamente os de Nicea, d'Arles, de Carthago e de Elvira, achamos que a Egreja condemna, em theoria, o emprestimo a juro. Na pratica, porém, tolera-o. Não insistamos na contradicção. Se é permittido o emprestimo a juro, quaes são as condições? Tem alguem direito de fixar o beneficio do devedor? Quem é? O Estado? Se é o Estado que fixa a taxa do juro, é o Estado quem definitivamente decide do que Deus concede e do que Deus prohibe, do que é e do que não é peccado, e por tanto a lei divina varia com a phantasia da lei. Se não é o Estado, é o uso da terra? Ha nada mais injusto e irregular? Que principio cumpre adoptar? Onde está o direito? Onde o abuso? Que é da regra? Não ha nenhuma? Não ha. A tal respeito é tamanha a desordem entre os theologos como entre os estadistas, e philosophos, e economistas e jurisconsultos, e entre os confessores e penitentes. Varia em cada diocese a jurisprudencia: não vamos tão longe; varia em cada parochia. Mudai de confessor, e vereis que o mesmo facto, cercado das mesmas circumstancias, muda o nome: peccado mortal, injustiça, expoliação no confessionario á direita, acto licito no confessionario á esquerda, debaixo do mesmo campanario, em nossas opiniões, e o seu facho milagroso vasqueja