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O INFERNO

barretes, aquelles doutores tartamudêam, gaguejam, balbuciam freneticamente, não se entendem a si proprios, descambam a cada passo, e movem á compaixão, se os compararmos a Deus. Dado que elles ainda durassem e crescessem em saber, ao mesmo passo que envelhecessem, nem por isso deixariam de estar como em perpetua infancia confrontados com Aquelle que tudo sabe, porque é infinito em sabedoria, em poder e bondade. Mas, d'outra fórma, a criancinha hontem nascida podeis já affoitamente comparal-a áquelles graves doutores; é um doutor que se aleita e entra em dentição: alguns dias mais, e vêl-a-heis defender these e supplantar os professores.

Comprehendeis, pois, que, se o velho doutor em theologia fosse pae, mettesse o filho em um carcere cheio de serpentes e ahi o deixasse para sempre? Qualquer que houvesse sido a culpa do menino, julgareis justo e discreto similhante castigo? Não vos pareceria o mestre mais louco do que o discipulo, e o pae peior que o filho? O vosso primeiro empenho não seria pôr o algoz no logar da victima? Não se levantaria toda a sociedade contra esse sabio sem coração? Nossas leis, nossos tribunaes consentil-o-hiam? Ah! castigos, sim, mas castigos que corrijam, e o perdão a final: eis o que é justiça de pae. Não entendemos outra. Ao chefe de familia não se consente poder arbitrario sobre os seus: a esposa tem direitos; tem-os o filho, o servo, protegidos pela sociedade, que para esse fim especialmente se constituiu. Se isto repugna ás antigas tradições,