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E todos sentem a fascinação do encanto — as turbas confusas e os homens inteligentes.

É o portador do espírito da Hélade. No portal da sua morada bem se podia gravar o misterioso enigma da Antologia: "Nasci no bosque sagrado e sou feito de ferro. Tornei-me o secreto depositário das musas e quando falo, intérprete e confidente único, ressoa o bronze eternamente."

E, entretanto, há por vezes no seu sorriso uma irônica amargura, na sua voz, que se vela, a secreta tristeza de quem está resignado a não dizer grandes verdades necessárias, e na sua alma, destinada à aclamação, uma delicadeza, uma modéstia infinita. Dois escritores ele os lê diariamente, ou pela manhã antes de começar a trabalhar, ou à noite antes de dormir — Renan e Cervantes. A vida fê-lo vestir os ímpetos e a imensa paixão lírica no burel de uma suave ironia. Quem o lê pensa em Luciano de Samósata, no ridículo do herói manchego, no travo das fantasias desfeitas. Mas, de raro em raro, surgem, como a reivindicação das idéias generosas, as tristes e delicadas imprecações da sua prosa, e em conversa muita vez quando todos riem, um doloroso suspiro de cansaço e tédio passa no seu lábio, de todos despercebido. E é ainda essa alma esquisita que cora e se confunde, quando pela milésima vez numa tarde alguém se lembra de dizer que o acha incomparável.