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chão. Apanhei-as, apertei-as na gravata branca e metti tudo no bolso.

Isto tinha sido feito convulsivamente, inconscientemente. Dei com os olhos em Rytmel. Pela primeira vez via contracção mortal do seu rosto. Chamei-o, fallei-lhe! Estava frenetica! Porque não queria elle acordar? Empurrei-o, irritei-me com elle. Porque estava assim, porque me fazia chorar? Tinha vontade de lhe bater, de lhe fazer mal.

— Acorda! acorda!

Insensivel! Insensivel! Morto! Ouvi passar na rua um carro. Havia pois alguem vivo!

De repente, não sei por que, lembrei-me que tinha esvasiado o frasco! Deviam ser só duas gotas! Estava morto!

Gritei:

— Betty! Betty!

Ella appareceu, arremessei-me aos seus braços. Chorei. Voltei para junto d’elle. Ajoelhei. Chamei-o. Quiz dar-lhe um beijo: toquei-lhe com os labios na testa. Estava gelada. Dei um grito. Tive horror d’elle. Tive medo do seu rosto livido, das suas mãos geladas!

— Betty, Betty, fujamos!

Consciencia, vontade, raciocinio, pudor, perdi tudo aos pedaços. Tinha medo, sómente medo, um medo trivial, vil!

— Fujamos! Fujamos!

Não sei como saí.

Fóra da porta vi ao longe, no começo da rua, uma luz caminhar! caminhava, crescia! Havia alguem, vestido de vermelho, que a trazia! Parecia-me ser sangue! A luz crescia. Esperei, a tremer. Aquillo caminhava para mim. Approximava-se! Eu estava encostada á porta, na sombra, fria de pedra. A luz chegou: vi-a. Era um padre, era outro homem com uma opa vermelha e uma lanterna. Iam levar a alguem a extrema uncção...

Amparei-me no braço de Betty, e principiei a andar, sem saber para onde, como louca.[*]

[*] Seguiam-se as linhas em que se contava o encontro que teve commigo, as quaes linhas elimino por se referirem a successos que eu mesmo narrei e que v. sr. redactor, já conhece. — A. M. C.