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Rodolpho Theophilo

Que podia oppor a humana força á furia desencadeada do vento e do mar?

Os mastros rangiam na imminencia de serem arrancados pelo vendaval. As gaveas tinham sido quebradas e o vento as lançara ao mar. As bigotas e os cabos se haviam rompido e as enxarcias, cahidas a meia nau, eram aos poucos carregadas pelas ondas.

As helices moviam-se no ar quando o navio, trepado á crista de uma vaga monstruosa, afocinhava no abysmo.

As ondas varriam a coberta, espadanando espumas de bombordo a estibordo, salpicando até as cestas das gaveas, não alagando o navio, não o afundando por se acharem fechadas as escotilhas.

Parte das obras mortas tinham sido levadas pelas vagas. Os mastros achavam-se de todo nús. Até as antennas do telegrapho tinham desapparecido.

Embora sua grande tonelagem, a tempestade brincava com o navio como um pedaço de cortiça. Havia dez horas que começara a tormenta. Fôra precisamente á meia noite, quando o sarau ia em meio.

Eram dez horas do dia, o sol estava alto e o céo parecia envolto ou alumiado pela claridade baça de um crepusculo vespertino equatorial.

O vento foi amainando, tornando-se brando, acabando em brisa. O mar que se erguia em altas rochas foi se achatando e a sua superficie cavada, nivelou-se como a face de um tranquilo e sereno lago.

A treva foi porco a pouco esmaecendo, diluida pela luz, o mar, o céo, o navio individualisando-se na grande téla, os uivos da tormenta calando-se, e dominando tudo o silencio das solidões marinhas.