XXI
O negrinho
HAVIA um fazendeiro, ou estancieiro, como se diz lá no Sul, que era muito mau para os escravos — isso foi no tempo em que havia escravidão neste país. Uma vez comprou uma ponta de novilhos para engordar em seus pastos. Era inverno, um dos peores invernos que por lá houve, de tanto frio que fazia.
— “Negrinho, disse o estancieiro para um molecote da fazenda, que andava ali pelo terreiro. Estes novilhos precisam acostumar-se nos meus pastos, porisso você vai tomar conta deles. Todas as tardes tem de tocar a ponta inteira para o curral, onde dormirão fechados, depois de contados por mim. Tome muito tento, hein? Se faltar na contagem um só que seja, você me paga.
O pobre molecote só tinha quatorze anos de idade; mesmo assim não teve remedio senão ir para o campo tomar conta do gado. Era gado arisco, ainda não querenciado naquela fazenda, de modo que, para começar, logo no primeiro dia um dos novilhos faltou na contagem.
O estancieiro não quis saber de explicações. Vendo que o numero não estava certo, botou o cavalo em que estava montado para cima do negrinho e deu-lhe uma tremenda sova de chicote. Depois disse:
— “E agora é ir procurar o novilho que falta. Se não me der conta dele, eu dou conta de você, seu grandississimo patife!”