Página:O abolicionismo (1883).djvu/192

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esse Eldorado em nosso país, e que por isso tem que resignar-se a viver e criar os filhos, nas condições de dependência e miséria em que se lhe consente vegetar.

Esta é uma pintura que, com verdadeiro sentimento humano, fez de uma porção, e a mais feliz, dessa classe um senhor de engenho no Congresso Agrícola do Recife em 1878:

O plantador não fabricante leva vida precária; seu trabalho não é remunerado, seus brios não são respeitados; seus interesses ficam à mercê dos caprichos do fabricante em cujas terras habita. Não há ao menos um contrato escrito, que obrigue as partes interessadas; tudo tem base na vontade absoluta do fabricante. Em troca de habitação, muitas vezes péssima, e de algum terreno que lhe é dado para plantações de mandioca, que devem ser limitadas e feitas em terreno sempre o menos produtivo; em troca disto, parte o parceiro todo o açúcar de suas canas em quantidades iguais; sendo propriedade do fabricante todo o mel de tal açúcar, toda a cachaça delas resultante, todo o bagaço, que é excelente combustível para o fabrico do açúcar, todos os olhos das canas, suculento alimento para o seu gado. É uma partilha leonina, tanto mais injusta quanto todas as despesas de plantação, trato da lavoura, corte, arranjo das canas e seu transporte à fábrica, são feitas exclusivamente pelo plantador meeiro.

À parte os sentimentos dos que são equitativos e generosos, o pobre plantador de canas da classe a que me refiro nem habitação segura tem: de momento para outro pode ser caprichosamente despejado, sujeito a ver estranhos até a porta da cozinha de sua triste habitação, ou a precipitar a sua saída, levando à família o último infortúnio. [1]

Essa é ainda uma classe favorecida, a dos lavradores meeiros, abaixo da qual há outras que nada têm de seu, moradores que nada têm para vender ao proprietário, e que levam uma existência nômade e segregada de todas as obrigações sociais, como fora de toda a proteção do Estado.

  1. Congresso Agrícola do Recife, p. 323-324, observações do Sr. A. Vitor de Sá Barreto.