Página:O cabelleira - historia pernambucana (1876).djvu/247

Wikisource, a biblioteca livre

A voz do bandido, ao principio titubante e temerosa, foi-se pouco e pouco animando, e elevando.

Quando houveram de passar á ave-maria, o Cabelleira tinha já os olhos pregados na cruz, e a fé, que começava a germinar em seu espirito, elevava-o insensivelmente a regiões desconhecidas, onde, sem que elle pudesse explicar como, lhe davam a respirar confortos que só podiam ser celestiaes.

Da ave-maria passaram á santa-maria e desta á salve-rainha.

Em cada uma das palavras destas orações achava o bandido uma belleza nova e insinuante que lhe despertava delicioso sentir.

Seu espirito, que durante vinte annos só conhecêra idéas de sangue e morte; seus ouvidos, affeitos a escutarem palavras licenciosas, insultos, arrogancias, queixumes e maldições; recebiam agora doces expressões que annunciavam uma consoladora existencia superior.

Do pavor, que trouxera aos pés da cruz, passára a uma fortaleza de animo quasi invencivel.

Antes de se levantar volveu os olhos em torno de si e não viu mais a visão que o amedrontára, havia pouco.