Página:O cabelleira - historia pernambucana (1876).djvu/73

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importar com a vida dos outros filhos de Deus.

Os dous matadores não estavam, ao menos naquelle momento, para estas banalidades, e, conscios de que urgia remover o óbice, saltaram sobre o crioulo, e, apeando-o com violencia, tomaram-lhe o animal, o qual se deixou passivamente conduzir pelo cabresto a um fechado da capoeira onde Joaquim julgou prudente recolhel-o sem demora.

Gabriel, que de pé e immovel viu, com lagrimas nos olhos, desapparecer o seu unico bem, reflexionou com pezar:

— Então, vosmecês vão montados para sua casa, e eu é que hei de ir para a minha de pé, sem o meu cavallo, heim?

— Ainda estás ahi fallando, negro? Quererás tomar-nos satisfações? replicou o Cabelleira voltando-se de chofre e fixando sobre o Gabriel a vista que chammejava como a de um chacal.

— Sim, eu sou negro, é verdade; mas os brancos tomam-me o que é meu, e deixam-me sem caminho nem carreira, com uma mão adiante e a outra atraz.

A estas vozes o Cabelleira não pôde mais conter-se, e de um só pulo fez-se sobre o seu interlocutor. Este, porém, já não se achava no mesmo lugar, mas sobre uma das lages que