Página:O cortiço.djvu/317

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dentro de casa cuidava de outras. A filharada crescia-lhes, que metia medo. "Era um no papo outro no saco!" Moravam agora também desse lado os dois cúmplices de Jerônimo, o Pataca e o Zé Carlos, ocupando juntos o mesmo cômodo; defronte da porta tinham um fogãozinho e um fogareiro, em que preparavam eles mesmos a sua comida. Logo adiante era o quarto de um empregado do correio, pessoa muito calada, bem vestida e pontual no pagamento; saia todas as manhãs e voltava às dez da noite invariavelmente; aos domingos só ia à rua para comer, e depois fechava-se em casa e, houvesse o que houvesse no cortiço, não punha mais o nariz de fora. E, assim como este, notavam-se por último na estalagem muitos inquilinos novos, que já não eram gente sem gravata e sem meias. A feroz engrenagem daquela máquina terrível, que nunca parava, ia já lançando os dentes a uma nova camada social que, pouco a pouco, se deixaria arrastar inteira lá para dentro. Começavam a vir estudantes pobres, com os seus chapéus desabados, o paletó fouveiro, uma pontinha de cigarro a queimar-lhes a penugem do buço, e as algibeiras muito cheias, mas só de versos e jornais; surgiram contínuos de repartições públicas, caixeiros de botequim, artistas de teatro, condutores de bondes, e vendedores de bilhetes de loteria. Do lado esquerdo, toda a parte em que havia varanda foi monopolizada pelos italianos; habitavam cinco a cinco, seis a seis no mesmo quarto, e notava-se que nesse ponto a estalagem estava já muito mais suja que nos outros. Por melhor que João Romão reclamasse, formava-se ai