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Meus piedosos pensamentos elevam-se n'este momento a Darumá. Segundo a tradição da gente japonesa. Darumá, o grande apostolo indiano do buddhismo, veio á China ahi pelo começo do seculo VI da nossa era christã, e em terras chinezas prégou em honra da verdade, illuminado o espirito dos povos.

Consta que, por voluntaria desistencia das ephemeras alegrias terreaes, Darumá votou-se a passar a vida de joelhos sobre o solo pedregoso, absorto em contemplações mysticas,

sem mesmo permittir-se o simples regalo de dormir. Tantos annos permaneceu de tal maneira, que as pernas se lhe gastaram, claro está; e é assim, sem pernas, só com a cabeça e com o tronco, envolto n'um manto carmezim, que ainda hoje é figurado. A imagem tornou-se querida e popular entre esta boa gente japoneza; é mesmo um brinquedo corriqueiro entre as mãositas das creanças, — os santos e os meninos vivem sempre em boa companhia; — lembrando o tal brinquedo o nosso frade de sabugo, pela teima em voltar, por mais voltas que lhe dêem, á sua postura habitual. Deve ainda saber-se que Darumá tem dado assumpto, desde remotos tempos até hoje, a pintores da mais alta valia; Hokusai foi um d'elles, pintando um famoso Darumá sobre uma folha de papel de cerca de duzentos metros quadrados de grandeza, empregando oitenta litros de tinta no desenho e servindo-se de cinco vassouras á laia de pinceis: estendida a tela sobre o campo,