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em mimicas hieraticas, quaes mãos de mystica officiante de uma religião desconhecida. Por fim, convidado a partilhar no sacrificio, acceitava uma taça com chá que me era offerecida e levava-a nos labios commovido, com não sei que subitos escrupulos de apostata mal firme . . .

Tama-Guiku concluiu. Ergueu-se, deslumbrante de graças, de atavios, de magestade. O seu rostinho meigo illuminava-se então da exaltação beatifica que lhe electrizava o espirito; dirigiu sobre nós a ardencia negra dos seus olhos, saudou-nos reverente. . . reverente, não porque uma imfima cortezia sequer lhe merecessemos,— pobres occidentaes ignaros! — mas em estricta abediencia aos preceitos rituaes; e desappareceu da scena.

A proposito d'estas divagações respeitantes ao chá e ao seu culto, vem-me agora ao pensamento e ainda me compunge um dramatico episodio da existencia intima japoneza, que contado me foi ha cerca de tres annos. Vou tentar descrevel-o.

Éra no fim de maio. Eu achava-me em Kobe. Um meu amigo japonez, chajin apaixonado, partira para Uji, onda devia assistir a umas costumadas reuniões votadas ao cha-no-yu, em casa de um parente, cuja filha, a gentilissima O-Hana, era eximia na arte; entre nós ficára combinado que eu iria encontral-o, passadas tres semanas, em Nara, a cujos velhos monumentos queriamos votar horas de estudo.

Haviam decorrido apenas uns tres dias, quando do tal sujeito recebi um bilhete, pouco mais ou menos n'estes termos:— “Pode seguir para Nara, onde me encontrará. Falhou o chá-no-yu. O-Hana suicidou-se. Pesava sobre ella uma desdita igual