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CAPITULO VII
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pela sua observação conscienciosa[1] que, fazendo a cavallo o percurso do Recife ao Rio Grande do Norte, se detivera em Goyanna — foi isto em 1815 — para assistir á tomada do habito por um novo monge, espectaculo raro, accrescentava, que por tal motivo attrahira muita gente das cercanias da pequena cidade. Aliás os conventos não se recommendavam pela sua piedade e outras virtudes: eram fócos intellectuaes para um paiz nas trevas do espirito, mas tambem theatros de gozos materiaes, em que a gula não era o único peccado. Alguns monges salientavam-se naturalmente pela devoção e moralidade; outros pela sua operosidade e saber, podendo citar-se oradores sagrados como Sampaio e Montalverne, botanicos como Conceição Velloso e Leandro do Sacramento, eruditos como Custodio Alves Serrão e Camillo de Monserrate.

A genialidade não se elevava entretanto a essa altura mental e foi preciso o estro de Junqueira Freire, nas Inspirações do Claustro, antes de desertar a vida monastica, para dotar os conventos brazileiros de uma reminiscencia de idealismo. A própria catechese dos indigenas, que tanto sublimou os jesuitas dos seculos XVI a XVIII, não attrahia os frades. Tambem por isso os não cercava a veneração publica: faltava-lhes a aureola da santidade, e ao governo o que sobremodo interessava era o patrimonio dos conventos, enriquecidos, sobretudo os benedictinos, pelos bemfeitores que buscavam redimir seus peccados. Da fiscalização sobre as corporações da mão morta veio a desprender-se a Republica, entregando ás ordens religiosas, mesmo povoadas de estrangeiros, a plenitude e livre disposição dos seus bens, que o Imperio quizera transformar de propriedades de raiz urbanas e ruraes em apolices da divida publica. Conventos havia donos de fazendas e plantações pessimamente administradas no geral. O senador Nabuco de Araujo quiz em 1855 e 1857, quando ministro da Justiça, ser até certo ponto o Mousinho da Silveira brazileiro com relação ao clero regular e não achou para isso opposição nem do episcopado nem da Curia Romana, porque

  1. Henry Koster, Travels in Brazil, Londres, 1816.