«Preoccupado da sua pessoa, dos seus direitos, das suas
paixões e dos seus prazeres, elle (D. Pedro I) não estabeleceu
relação alguma entre a ventura dos seus subditos e a sua propria,
e isolou-se no meio da nação a mais docil e a mais
reconhecida. Como Luiz XIV, fez do seu Eu o Estado, sem entretanto
imitar o grande Rei a não ser no despotismo, na pompa,
nos validos e nas amantes. Para supprir o apoio moral da
opinião que se esquivava, promoveu mais do que nunca o
espirito militar, forçando o caracter pacifico e industrioso que
deve convir a um povo agricola, habitando um territorio enorme,
deserto e sem vizinhos formidaveis. Com as mesmas vistas
fez consistir a prosperidade do Brazil, não no progresso
das suas artes e da sua agricultura, mas no esplendor fofo de
uma côrte apparatosa, para o que era mister fomentar por
seducções enganadoras a paixão de um luxo destruidor e recompensar
por meio de distincções honorificas aquelles que reduziram
á miseria a rica herança de seus pais. Nada faltou ao
espectaculo dessa grandeza inerte, apparente e ridicula, nem
sequer uma aristocracia de chinellos, alimentada pelo orçamento
e cujos brazões heraldicos o povo não podia contemplar sem
rir. De tudo isto nem a fumaça se enxergou no dia 7 de Abril:
D. Pedro I extendendo os braços em redor de si, só deparou
com a solidão, o vazio, as trevas e o desespero.»
As catilinarias são um genero litterario facil e de infallivel popularidade. Eram os marquezes do primeiro reinado aquelles que assim ridicularizavam o titular do segundo reinado. O Libello data de 1848. Em 1853 Timandro convertera-se á conciliacão: seria director do Thesouro, ministro da Fazenda indicado pelo Imperador, visconde de Inhomirim, por fim senador, rompendo o monarcha com o seu gabinete por motivo dessa escolha que constitucionalmente cabia nas suas attribuições soberanas. D. Pedro II dava n'esse caso um dos exemplos mais flagrantes da sua superior tolerancia, a qual foi constante para as faltas politicas, absoluta para as convicções ou opiniões mesmo adversas, e apenas reservada para as faltas de moralidade e os attentados contra a probidade. A honestidade era de rigor.