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O IMPERIO BRAZILEIRO

aos estrangeiros. A desordem armada pudera ser mais ou menos domada, mas não arrastara na sua queda a desordem civil. Tinha subsistido uma condição de rivalidades pessoaes, de ciumes de grupos parlamentares, de rancores de facções, sobretudo locaes, complicados com antipathias de raças e com despeitos de classes e tanto mais accesos quanto a tonalidade geral dessa sociedade politica era ainda não pouco grosseira e inculta, não obstante exemplares acabados de educação e de saber. Uma intriga terrivel grassava atravez todo o Imperio e a revolução de 1848 foi a explosão não inesperada mas abortiva desse estado malsão: em linguagem medica dir-se-hia talvez com propriedade ter vindo á suppuração um abcesso purulento.

O gabinete de 1844, conservador no rotulo, liberal em muitos dos seus actos, proviera da incompatibilidade entre o chefe do anterior ministerio, Honorio Hermeto Carneiro Leão (depois marquez do Paraná e politico do maior prestigio) e a «facção aulica» dirigida por Aureliano Coutinho (Sepetiba). Começou por conceder amnistia aos revoltosos liberaes de 1842, justificando mesmo sua attitude com as leis repressivas de 1841, e recorreu á dissolução da Camara, cuja maioria lhe era por isso hostil e onde difficilmente se formou uma minoria de apoio ao governo, graças ás discordias provinciaes que puzeram em conflicto seus respectivos representantes na Assembléa Geral. As eleições que se seguiram occorreram sob uma forte pressão official, precedida de reversões de juizes de direito e demissões de altos funccionarios e delegados de policia. As desordens foram numerosas e a fraude imperou em todas as freguezias. Os revolucionarios de 1842, aproveitando a amnistia, tomaram a sua desforra, sem todavia lograrem impôr-se á facção conservadora da nova maioria, igual em proporção, e obter a execução das suas idéas de reforma ou, mais precisamente, a abrogação das leis reputadas inconstitucionaes. Data dessa epocha a fusão pernambucana entre conservadores ministeriaes, como Urbano Sabino e Nunes Machado, e os ultra-liberaes ou praieiros inimigos da oligarchia territorial das poderosas familias Cavalcanti,