Página:O livro de Esopo fabulario português medieval.pdf/130

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sec. xiv, «eu matarei uós»[1]; sec. xv, «salvaae mym creente e obediente a vós»[2]; «e sabe reger sy e os outros»[3]; «ty servyndo»[4]; «ouve, Christo, mym»[5]. Tambem em gallego do sec. xiii: «pignore el por v solidos»[6].

b) Em português moderno é de uso na lingoa literaria intercalar os pronomes atonos me, te, o, etc., nos futuros e condicionaes dos verbos (tmese), por ex. louvar-te-ha[7]; só a lingua popular diz louvará-te[8]. O nosso texto tem exemplos dos dois empregos: faze-lo-hei, fará-o, darei-te, xxviii, 8.

c) Emprego de nehũu por «ninguem»: «nhũu nom deue brincar com alguem ssem ssua voomtade» sviii, 14; «nehũu que está em liberdade nom se faça sseruo» l., 21. — Cfr. no Leal Conselheiro, p. 290: «nenhuũ deve d’escolher os moços guyadores dos exercitos guerreadores».

d) O pronome indefinido todo junta-se ao seu substantivo sem de permeio se empregar o artigo o: toda jente, xix, 21, e xxiii, 25; todas bondades, xxxiv, 51; todo sseu proueyto, xxxv, 21; toda cousa, xliii, 18. Este uso é tão geral em toda a literatura portuguesa antiga, inclusive a classica, que não vale a pena citar exemplos. Em português moderno é raro[9].

e) Homem póde empregar-se sem artigo, com as funcções de pronome sujeito: vid. § 35-c. Cfr. tambem: «o coraçorn uill he aquell que faz homem sseer pera pouco», xxii, 11-12. No seguinte passo «ela nom poderia ja nunca achar homem que a tanto amasse», xxxiv, 27, homem póde ser pronome indefinido, valendo por «ninguem», ou póde ter o seu valor proprio, pois hoje tambem assim se diria.

f) O pronome relativo cujo, cuja póde empregar-se como predicativo, contrariamente ao uso da lingoagem moderna, que só o admitte como attributivo: «tornou a cadella, cuja era

  1. Demanda do Santo Graall, p. 31. Não deve entender-se matarei-vos, porque a frase completa é: «ou vós me matade, ou eu matarei vós».
  2. Ineditos de Alcobaça, i, 235.
  3. Leal Conselheiro, p. 289.
  4. Ibidem, p. 478.
  5. Ibidem, p. 479.
  6. Doc. galleg. de los siglos xiii al xvi, p. 16.
  7. Vid. Epiphanio Dias, Gram. port., § 188.
  8. Vid. a minha Esquisse d’une Dialectologie Portugaise, p. 147.
  9. Cfr. os meus Dialectos extremenhos, i, 19.