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Cá donde nada val a Poesia,
E s’está da lei della escarnecendo;
Cá donde a fidalguia Mahometana
Cuida qu’um nome vão a Deos engana.

Cá nesta Babylonia, onde a Nobreza
Da Lusitana gente se perdeo;
E do grão Sebastião toda a grandeza
Irreparavelmente se abateo;
Cá donde algum mentir não he baixeza,
E os meritos esmola (assi cresceo
Da cobiça mortal a semrazão)
Co’o esfôrço e saber, pedindo vão.

Ás portas da cobiça e da vileza
Estes netos de Agar estão sentados
Em bancos de torpissima riqueza,
Todos de tyrannia marchetados.
He do feio Alcorão summa a largueza
Que tẽe para que sejão perdoados
De quantos erros commettendo estão
Cá neste escuro cáos de confusão.

Cumprindo o curso estou da natureza,
Illustre Dama, neste labyrintho;
Mas quem usa comigo mais crueza,
He tua condição, que n’alma sinto.
Acabe-se algum dia tal tristeza,
E este sentido mal qu’em versos pinto:
E pois n’alma he sentido e coração,
Ve se m’esquecerei de ti, Sião.