Página:Obras completas de Luis de Camões II (1843).djvu/279

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meu damno as rosas matutinas,
Condoidas se cerrão, s'emmurchecem;
Com meu suspiro ardente as côres finas
Perdem o cravo, o lyrio, e não florecem.
Co'a roxa aurora as pallidas boninas,
Em vez de se alegrarem, s'entristecem:
Deixão seu canto Progne e Philomena;
Que mais lhes doe, que a sua, a minha pena.
  Responde o monte concavo a meus ais,
E tu como aspid, cerras-lhe o ouvido;
Os indomitos feros animais,
Sem humano sentir, mostrão sentido:
Mas em ti minhas dores desiguais
Nunca movem o peito endurecido:
Por muito que te chame, não respondes;
E quanto mais te busco, mais t'escondes.
  Naquella parte donde costumavas
Apascentar meus olhos e teu gado;
Alli donde mil vezes me mostravas,
Qu'era o pastor de ti mais desejado,
Vezes mil te busquei, por ver se davas
Algum breve descanso a meu cuidado.
Busco-te em vão no valle, em vão no monte,
Qual o ferido cervo busca a fonte.
  Este lugar de ti desamparado,
Com cujas sombras frias ja folgaste,
Agora triste, escuro he ja tornado;
Que todo o bem comtigo nos levaste.
Eras tu nosso sol mais desejado;
Não temos luz, despois que nos deixaste.{206}