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Página:Obras completas de Luis de Camões II (1843).djvu/424

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  Nesses formosos olhos, d'enlevada,
Minh'alma se escondeo,
Quando ordenava o Ceo
Que vivesse comigo desterrada.
Vós a mais certa estrada
De ver a summa alteza,
Do efeito a causa abris a est'alma minha.
Assi mortal belleza
Só della nasce, e nella se resume;
Assi celeste lume
Lá dos ceos se deriva, e lá caminha.
Pois, como a Deos unir-me a vista possa,
Porque a negais, meu sol, a est'alma vossa?
  Se me quereis prender a parte a parte,
Cabello ondado e louro,
Tecei-me a rede de ouro
Em que prendeo Vulcano a Cypria e Marte.
Des que com gentil arte
Vestis de flores bellas
A terra em que tocais co'a bella planta,
Quantas vezes com vellas
Quiz n'huma d'essas flores transformar-me?
Porque, vendo pizar-me
D'esse candido pé, que a neve espanta,
Póde ser que na flor mudado fôra
Que deo a Juno irada a linda Flora.
  Mas onde te acolheste (ó doce vida!)
Mais leve e pressurosa,
Do que na selva umbrosa
Cerva d'aguda setta vai ferida?
Se para tal partida,{