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LEIS DA VARIAÇÃO
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didas espécies distintas, às quais poderia juntar-se uma terceira, o nabo ordinário. Na hipótese da criação independente das espécies, teríamos que atribuir esta semelhança de desenvolvimento de caules nas três plantas, não à verdadeira causa, isto é, à comunhão de descendência e à tendência a variar numa mesma direcção que é a consequência, mas a três actos distintos da criação, actuando sobre formas extremamente vizinhas. Naudim observou muitos casos semelhantes de variedades análogas na grande família das cucurbitáceas, e diversos sábios nos cereais. M. Walsh discutiu ùltimamente com muito talento diversos casos semelhantes que se apresentam nos insectos no estado de natu- reza, e agrupou-os sob a sua lei de igual variabilidade.

Todavia, encontramos um outro caso nos pombos, isto é, a aparição acidental, em todas as raças, de uma coloração azul-ardósia, de duas faixas negras sobre as asas, dos flancos brancos, com uma barra na extremidade da cauda, de que as penas exteriores são, junto da base, exteriormente bordadas de branco. Como estes diferentes sinais constituem um carácter de origem comum, o torcaz, ninguém contestaria, creio eu, que isto seja um caso de regressão e não uma variação nova e análoga que aparece em muitas raças. Podemos, assim o penso, admitir esta conclusão com toda a segurança; porque, como temos visto, estes sinais coloridos estão muito sujeitos a aparecer nos filhos resultando do cruzamento de duas raças distintas tendo uma coloração diferente; ora, neste caso, não há nada nas condições exteriores de existência, salvo a influência do cruzamento sobre as leis da hereditariedade, que possa causar a reaparição da cor azul-ardósia acompanhada de outros diversos sinais.

Sem dúvida, é muito surpreendente que reapareçam caracteres depois de terem desaparecido durante um grande número de gerações, centenas talvez. Mas, numa raça cruzada uma só vez com uma outra raça, a descendência apresenta acidentalmente, durante muitas gerações — alguns autores dizem durante uma dezena ou mesmo durante uma vintena — uma tendência a regressar aos caracteres da raça estrangeira. Depois de doze gerações, a proporção do sangue, para empregar uma expressão vulgar, de um dos predecessores é apenas de 1 para 2048; e portanto, como vemos, julga-se geralmente que basta esta proporção infinitamente pequena de sangue estranho para determinar uma tendência ao regresso. Numa raça que não tenha sido cruzada, mas na qual os dois predecessores-origem têm perdido alguns caracteres que possuía o seu predecessor comum, a tendência ao regresso a este carácter perdido poderia, depois de tudo o que podemos saber, transmitir-se de modo mais ou menos