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DIFICULDADES DA TEORIA
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Se observamos a distribuição actual das espécies sobre um vasto território, vemos que são, em geral, muito numerosas numa grande região, que depois se tornam de repente cada vez mais raras sobre os limites desta região e que terminam por desaparecer. O território neutro, entre duas espécies representativas, é pois geralmente muito estreito, comparativamente ao que é próprio a cada uma delas. Observamos o mesmo facto fazendo a ascensão de uma montanha; Alphonse de Candolle fez notar com que rapidez desaparece por vezes uma espécie alpina comum. As sondagens efectuadas à draga nas profundezas do mar fornecem resultados análogos a E. Forbes. Estes factos devem causar alguma surpresa àqueles que consideram o clima e as condições físicas da existência como os elementos essenciais da distribuição dos seres organizados; porque o clima, a altitude ou a profundidade variam de maneira gradual e insensível. Mas se pensarmos que cada espécie, mesmo no seu centro especial, aumentaria imensamente em número sem a concorrência que lhe opõem as outras espécies; se nós pensarmos que quase todas servem de presa às outras ou lutam entre si; se nós pensarmos, enfim, que cada ser organizado tem, directa ou indirectamente, as relações mais íntimas e mais importantes com os outros seres organizados, é fácil compreender que a extensão geográfica de uma espécie, habitando um país qualquer, está longe de depender exclusivamente das mudanças insensíveis das condições físicas, mas que esta extensão depende essencialmente da presença de outras espécies com as quais se encontra em concorrência e que, por conseguinte, ou lhes serve de presa, ou a ela servem de presa. Ora, como estas espécies são por si mesmas definidas e se não confundem por gradações insensíveis, a extensão de uma espécie qualquer dependendo, em todos estes casos, da extensão das outras, tende a ser por si mesma nitidamente circunscrita. Além disso, sobre os limites do seu habitat, aí onde existe em menor número, uma espécie está extremamente sujeita a desaparecer em seguida às flutuações no número dos seus inimigos ou dos seres que lhe servem de presa, ou ainda com as mudanças na natureza do clima; a distribuição geográfica da espécie tende então a definir-se ainda mais manifestamente.

As espécies vizinhas, ou espécies representativas, quando habitam uma região contínua, são ordinàriamente distribuídas de tal maneira que cada uma delas ocupa um território considerável e havendo entre elas um território neutro, comparativamente estreito, no qual se tornam de repente cada vez mais raras; as variedades não diferindo essencialmente das espécies,