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ORIGEM DAS ESPÉCIES

mais que pobres plantas enfezadas, inteiramente estéreis, e conduzindo-se, sob todas as relações, como híbridos ordinários. Teria então o direito de afirmar, segundo as ideias recebidas, que forneceu realmente a prova de que estas duas variedades são espécies tão acentuadas quanto possível; contudo, estaria absolutamente enganado.

Os factos que acabamos de indicar nas plantas dimorfas e trimorfas são importantes porque provam, primeiramente, que o facto fisiológico da fecundidade diminuída, tanto nos primeiros cruzamentos como nos hibridos, não é uma prova certa de distinção específica; em segundo lugar, porque podemos concluir que deve existir qualquer laço desconhecido que liga a esterilidade das uniões ilegítimas à sua descendència ilegítima, e que podemos tirar a mesma conclusão para os primeiros cruzamentos e para os híbridos; em terceiro lugar, e isto parece-me particularmente importante, porque vemos que podem existir duas ou três formas da mesma espécie, não diferindo sob relação alguma de estrutura ou de constituição relativamente às condições exteriores, e que, contudo, podem ficar estéreis quando so unam de certas maneiras. Devemo-nos lembrar, com efeito, que a união dos elementos sexuais de individuos tendo a mesma forma, por exemplo a união de dois indivíduos de longo estilete, fica estéril, enquanto que a união de elementos sexuais próprios a duas formas distintas, é perfeitamente fecunda. Isto parece, à primeira vista, exactamente o contrário do que se passa nas uniões ordinárias entre os indivíduos da mesma espécie e nos cruzamentos entre espécies distintas. Todavia, é duvidoso que seja realmente assim; mas não me deterei mais sobre este obscuro assunto.

Em resumo, o estudo das plantas dimorfas e trimorfas parece autorizar-nos a concluir que a esterilidade das espécies distintas cruzadas, assim como a dos seus produtos híbridos, depende exclusivamente da natureza dos seus elementos sexuais, e não de qualquer diferença da estrutura e constituição geral. Somos igualmente levados à mesma conclusão pelo estudo dos cruzamentos recíprocos, nos quais o macho de uma espécie não pode unir-se ou se une apenas muito dificilmente com a fêmea de uma segunda espécie, enquanto que a união inversa pode operar-se com a maior facilidade. Gärtner, esse excelente observador, chegou igualmente a esta mesma conclusão, que a esterilidade das espécies cruzadas é devida a diferenças restritas ao sistema reprodutor.